terça-feira, 15 de setembro de 2009

[Crítica Social] Filosofia? Direitos humanos?

FILOSOFIA? DIREITOS HUMANOS?

Segundo dados divulgados na semana passada pela Ordem dos Advogados do Brasil, o índice de aprovação no último exame nacional de ordem, requisito para que bacharéis em direito exerçam a advocacia, foi particularmente ruim para o estado de São Paulo. Pela primeira vez os egressos dos cursos de direito paulistas participaram de um exame nacional, e não local e específico, de modo a permitir a comparação com outros estados – e São Paulo obteve a segunda pior colocação, com apenas 15,6% de aprovação.

São Paulo é, não por acaso, o estado brasileiro em que a proliferação desordenada e mercantilizada de cursos superiores se apresenta mais claramente. É também o estado em que os cursos de direito são marcados por um caráter acentuadamente técnico, não raro orientados de modo explícito para preparar os estudantes exatamente para o exame de ordem. Estes fatores devem ter alguma influência sobre o desempenho pífio apresentado.

Talvez baste, para entender melhor a questão, olhar para o extremo oposto da tabela. Dentre todos os cursos do Brasil, o que obteve melhor desempenho foi o da Universidade de Brasília, com 97,2% de aprovação. E a própria UnB declara que seu sucesso é devido “a um processo seletivo eficiente, à ênfase nas disciplinas humanistas e ao incentivo ao protagonismo do estudante” (Estado de S. Paulo, 03.09.2009). Ora, algo disso não está seriamente em falta nos cursos de direito paulistas?

Há quem pense que “essas coisas de filosofia e direitos humanos” são, nos cursos de direito, perda de tempo. Pensam que tudo que importa é formar juristas “práticos” – “técnicos” do direito, não “filósofos”, não “críticos”, não “teóricos”. Nos cursos de direito tecnocráticos e voltados exclusivamente ao mercado, este é exatamente o pensamento dominante. Ignoram, porém, algo essencial: a teoria sem prática pode ser ruim, mas a prática sem teoria pode ser ainda pior.

A prática do direito sem teoria, alheia à teoria, é, afinal, nada mais do que repetição cega e confirmação irrefletida desta realidade social cheia de mazelas que o direito só faz confirmar – ainda mais quando aplicado automaticamente, acriticamente, à maneira do tecnicismo reinante. A orientação imediata à prática tende a produzir este deletério efeito: faz com que os estudantes saiam dos cursos de direito sem saber o que exatamente é o direito e para que serve.

Paradoxal é que para quem pensa que tudo se resume à prática e à técnica, enfim, à completa insensibilidade crítica, o que costuma importar mais é exatamente o resultado da OAB. “Filosofia? Direitos humanos? Isto não enche barriga e não cai na OAB!” – é algo freqüente de se ouvir de estudantes de direito e mesmo de professores. Pois bem. Os resultados mostram que estão errados.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 09/09/2009. DIÁRIO (Dracena-SP), 13/09/2009.]

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