quarta-feira, 12 de agosto de 2009

[NJ] Desenvolvimento... sustentável?

DESENVOLVIMENTO... SUSTENTÁVEL?

“O lobo não vira vegetariano e o capitalismo não vira uma associação para a proteção da natureza e da filantropia.”
– Robert Kurz

A despeito da civilização, a despeito da cultura, a despeito de tudo que a humanidade pode pensar sobre si mesma, o homem é um ser natural e não pode viver sem o meio natural. A questão ambiental é, portanto, para a humanidade, uma questão de sobrevivência. Mas se é certo que não podemos viver sem consumir recursos naturais, é também certo que um tal consumo atingiu, nas últimas décadas, um nível de tal modo desenfreado, de tal modo absurdo que faz surgir a ameaça do esgotamento total do meio ambiente. E quanto mais próximo o esgotamento natural se mostra, mais se fala em meios de refrear a destruição da natureza. Aqui surge e ganha destaque o discurso do “desenvolvimento sustentável”.

Desenvolver de um modo sustentável significa, em teoria, manter o crescimento econômico de um modo compatível com o não-esgotamento do meio ambiente. Noutras palavras, uma tentativa de conciliar as relações econômicas da sociedade capitalista com a preservação da natureza: produzir, consumir, sim, mas num nível que a natureza poderia “suportar”.

Ora, certamente é interessante substituir milhares de sacolas plásticas de supermercado por algumas sacolas reutilizáveis, é melhor reciclar garrafas de refrigerante do que tê-las entulhando os esgotos das cidades, é melhor utilizar combustíveis renováveis e menos poluentes do que empestear a atmosfera terrestre com os resíduos de combustíveis derivados de petróleo. É melhor alguma atitude, afinal, do que atitude nenhuma. Mas até que medida é possível pensar em tais atitudes como solução ou como resposta adequada ao avanço da destruição ambiental? Até que medida é possível depositar esperanças nelas?

É preciso compreender, antes de tudo mais, o que efetivamente causa o avanço na destruição do meio ambiente. Em última instância, a causa reside exatamente naquelas relações econômicas que o discurso do “desenvolvimento sustentável” pretende continuar a ver em desenvolvimento. É a sociedade capitalista que, desde o seu advento, tem acelerado constantemente o consumo do meio natural. É esta sociedade da produção de mercadorias que exige uma exploração sempre mais voraz dos recursos naturais, orientada unicamente ao processo cego de multiplicação do capital. Quanto mais lucro, melhor – e quanto maior a exploração da natureza, em geral, maior o lucro.

Como, então, conciliar uma formação econômica inexoravelmente devastadora da natureza com a preservação da natureza? Como conciliar o processo de multiplicação do capital, que não tem nenhum outro fim senão a própria multiplicação do capital, com a preservação do meio ambiente, que exige precisamente uma restrição a tal multiplicação? Enfim, como conciliar o lobo com as ovelhas?

A resposta não pode ser outra: para além do superficial e incipiente nível do discurso, não há conciliação alguma. Não se trata de interromper a devastação da natureza, tampouco de inverter a ordem de prioridades – economia primeiro e natureza depois –, mas apenas de manter o crescimento econômico num nível menos devastador. Trata-se, na verdade, de destruir num ritmo menos voraz, exatamente para que a destruição mesma possa continuar. A natureza não importa por si mesma, importa tão-somente como “depósito” de recursos para a expansão contínua da economia mercantil. A sobrevivência que importa não é a dos homens, não é a do planeta, é a do capital.

As propostas de preservação simultânea do meio ambiente e das relações capitalistas estão, por isso, condenadas de antemão: serão, no fundo, propostas de preservação do capitalismo, não da natureza. Uma efetiva salvaguarda do meio ambiente exige uma atitude mais radical, exige uma reorganização produtiva, uma ruptura. O desenvolvimento sustentável é, por isso mesmo, na realidade, insustentável.

[Publicado no JORNAL DIÁRIO de Dracena-SP em 09/08/2009.]