domingo, 6 de junho de 2010

[Crítica Social] Futebol e política

FUTEBOL E POLÍTICA

Seria uma obviedade denunciar as ligações nem sempre claras, sobretudo no Brasil, entre futebol e política. Afinal, num país no qual o futebol ocupa tanto das atenções da população, no qual é socialmente necessário “torcer” por uma equipe qualquer deste esporte, no qual o símbolo máximo da identidade nacional é a camisa da seleção brasileira de futebol, tais ligações não poderiam mesmo estar ausentes. Ainda assim, parece que o assunto não pode ser deixado de lado.

Ora, num contexto como o nosso, no qual há um esporte absolutamente preferido, é notório que as atenções voltadas para o futebol podem rapidamente deixar de lado todo o noticiário que não o esportivo. A importância – direta ou indireta – da vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1970 para ditadura militar é, nesse sentido, bastante clara. O nacionalismo representado pela torcida pela seleção brasileira de futebol foi habilmente manipulado sob a forma do nacionalismo exacerbado propalado pela ideologia da ditadura, o nacionalismo do “Brasil: ame-o ou deixe-o”, da perseguição aos dissidentes políticos como “subversivos”, da defesa da “segurança nacional” pela perseguição e pela tortura e daí por diante.

Em sentido semelhante, toda a atenção hoje voltada para a próxima Copa do Mundo tem o efeito de obscurecer o debate propriamente político do momento. É como se nada mais importasse além da contagem regressiva para o início do mundial da África do Sul. E é impressionante observar como a convocação dos jogadores para a seleção brasileira é capaz de causar instantaneamente mais comoção do que qualquer dos nossos inúmeros e gravíssimos problemas sociais já causaram. É de causar perplexidade notar que uma expectativa ruim com relação ao desempenho da seleção brasileira na Copa gera muito mais insatisfação do que a miséria, a exclusão social ou a discriminação jamais geraram entre nós.

O fascínio pelo futebol – que, por sua vez, não é gratuito ou casual, mas devidamente construído – torna o público brasileiro, não raro, refém dos interesses da grande mídia na transmissão esportiva e, mais ainda, do jogo político que não hesita servir-se do futebol como instrumento. E não há perspectivas, pelos menos num futuro próximo, de que isto se modifique...

Prova disto é todo o discurso político levantado em função de ser o Brasil a sede da Copa do Mundo subseqüente, em 2014. Tal fato é não só contado como uma espécie de “vitória” política do atual governo como, mais ainda, é apresentado tanto como atestado do “desenvolvimento” pelo qual o Brasil já teria passado nos últimos anos (a ponto de ser hoje “capaz” de sediar uma Copa) quanto como uma propaganda antecipada do “desenvolvimento” que virá até 2014 (pois será necessário investir em infra-estrutura, urbanização, estádios etc.).

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 02/06/2010.]

Nenhum comentário: