terça-feira, 3 de novembro de 2009

[Crítica Social] Tecnologia e saber - semi-informação

TECNOLOGIA E SABER - SEMI-INFORMAÇÃO

Na edição anterior desta coluna, tentei mostrar que o controle do acesso ao saber integra o processo social de dominação e que, na sociedade capitalista, tal controle é dado através da redução da informação e do conhecimento à forma de mercadoria. Só tem acesso à mercadoria quem pode pagar por ela e, portanto, mesmo os progressos técnicos dos meios de comunicação, a despeito de encarados com muito otimismo, não servirão efetivamente à democratização do saber enquanto não for superado o caráter mercantil deste.

Há, no entanto, algo mais a considerar. Democraticamente ou não, o desenvolvimento dos meios de comunicação de fato propicia uma maior difusão das informações. Notícias do outro lado do planeta que, décadas atrás, levariam semanas para chegar, agora chegam instantaneamente. A guerra e o desastre em qualquer lugar são transmitidos ao vivo. A grande mídia tornou-se quase onipresente e, assim, já não existe a opção de manter o dominado em estado de total desinformação.

Paradoxalmente, no entanto, esta maior difusão não contribui para que o dominado tome consciência de sua própria condição. Ao contrário do que seria natural supor, este processo parece gerar mesmo mais conformismo. Isto se deve, sem dúvida, ao modo pelo qual esta ampla difusão tornou-se (e se torna cada vez mais) possível.

Convertida em indústria cultural, a grande mídia reproduz a lógica de dominação e exclusão social do capital ao produzir, como toda indústria, simultaneamente o seu produto e o seu consumidor. O seu produto é a informação fabricada em série, para o “grande público”, tal como sabão em pó ou fast food, o que implica em despolitização, homogeneização e, portanto, descaracterização da própria informação. E o seu consumidor é aquele que se informa (assim como se entretém, se educa etc.) exclusivamente por este caminho, ou seja, a indústria cultural.

Informando ostensivamente sobre tudo que não nos importa saber, a indústria cultural, nesse mesmo movimento, bloqueia a compreensão do que é mais relevante e urgente. Não há meio mais eficaz de fazer desconhecer algo do que obrigar a conhecê-lo só pela metade. Descobriu-se, afinal, que mais eficaz do que a desinformação é a semi-informação, a informação pela metade.

Assim, se a falta total de informação ao dominado contribui para a perpetuação do dominante, o excesso de informação industrializada não atua de modo diferente. O bombardeamento massivo de informação instantânea pela grande mídia conduz o seu consumidor a um estado de indiferença quanto ao que é informado. No flash do telejornal, a fome na África e o resumo do próximo capítulo da novela, a violência urbana e as fofocas de celebridades – tudo se torna indistinto. A informação perde o seu sentido quando a própria velocidade frenética do seu noticiamento impede a reflexão a seu respeito – ela passa a ser consumida mecanicamente como tudo mais na sociedade ultraconsumista contemporânea.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 28/10/2009. DIÁRIO (Dracena-SP), 01/11/2009.]

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