quinta-feira, 28 de março de 2013

[Crítica Social] Sobre a desocupação da aldeia Maracanã

SOBRE A DESOCUPAÇÃO DA ALDEIA MARACANÃ

Na manhã da última sexta-feira, 22/03, a polícia militar desocupou de forma muito violenta o terreno da aldeia Maracanã, no Rio de Janeiro. Antiga sede do Museu do Índio e ocupado de 2006, o local integra os planos de reestruturação do entorno do estádio do Maracanã para os eventos esportivos de 2014 e 2016. Diante do absurdo da violência e, sobretudo, diante dos interesses que animam esse absurdo, algumas reflexões podem ser levantadas.

I – Não é incomum encontrar aqueles que ainda concebem o índio como um semibárbaro (ainda que essa posição seja frequentemente “disfarçada” para evitar constrangimentos) e, assim, entendem que arrastar o índio para fora da sua vida tradicional é o mesmo que arrastá-lo para dentro da “civilização”, portanto um “favor” a ele prestado. Quando, no entanto, assistimos às cenas deploráveis de como esse “favor” é levado a cabo, é impossível não perguntar: de que lado está a barbárie e de que lado está a civilização? A atrocidade cometida contra o índio é uma demonstração cabal da incivilidade da sociedade que pretende civilizá-lo à força.

II – A violência contra o índio evidenciada no episódio da aldeia Maracanã é apenas uma ínfima parcela da violência sistemática e multissecular dirigida contra os indígenas do Brasil. O que espanta aqui é apenas o descaramento da violência cometida à luz do dia numa grande cidade, diante de veículos de imprensa e câmeras de TV, mas a violência que os indígenas sofrem, em silêncio e com a conivência da grande mídia, nas áreas mais distantes e, sobretudo, a violência que empurrou, desde o séc. XVI, os povos indígenas para as margens do território e da sociedade do Brasil é incalculavelmente maior.

III – A barbárie que vitimou os índios da aldeia Maracanã tem por “motor” os interesses bastante ávidos pela especulação imobiliária. Trata-se, em última análise, da barbárie intrínseca ao capital. Não há, no mundo contemporâneo, força maior: o capital não hesita passar por cima do respeito à diversidade, dos assim chamados diretos humanos, da dignidade ou mesmo da vida de quem quer que seja. Essa é a barbárie cotidiana do nosso mundo, repetida sem cessar sob a “capa” da civilidade do “melhor dos mundos possíveis”: a barbárie da miséria, da exploração do trabalho, da exclusão social, da violência estrutural contra todas as minorias etc. Os índios são apenas mais uma das “vítimas”: é preciso que todas as outras, a imensa maioria, se reconheçam como partes de uma mesma luta.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 27/03/2013.]

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