quinta-feira, 31 de março de 2011

[Crítica Social] Entre Japão e Líbia

ENTRE JAPÃO E LÍBIA

Já há alguns dias a grande mídia parece oscilar na dúvida entre qual deve ser a manchete do dia: as notícias sobre o vazamento de material radioativo na usina de Fukushima, no Japão, ou aquelas sobre o conflito militar na Líbia. As capas dos jornais variam, como que num movimento de pêndulo, entre um e outro dos eventos – sem saber, no fundo, de qual tema o leitor, após tantos dias, está menos cansado.

Os perigos relativos à usina nuclear japonesa não diminuíram, mas atenção absoluta dos noticiários foi desviada a partir do momento em que o sensacionalismo perdeu o efeito: os bombardeios na Líbia parecem mais atraentes. Por outro lado, a escalada na violência na Líbia não diminui e o conflito não faz senão agravar-se, mas eventualmente a mídia dá mais destaque à suspeita de radioatividade numa nova espécie de vegetal no Japão do que a algum massacre ocorrido nas últimas horas.

O que preocupa aqui, claro, não é a disputa acerca do que é mais grave. Não se trata de uma mórbida competição acerca de qual é o maior desastre e, assim, do que deveria ter mais destaque nos jornais. O que esta oscilação momentânea entre Japão e Líbia indica é o modo pelo qual a grande mídia decide, no fim das contas, o que é notícia – mais ainda, quais os critérios pelos quais isto se dá e quais os interesses aqui atendidos.

Tal como o fabricante de sabonete ou de macarrão instantâneo, os veículos de comunicação produzem mercadorias. Como empresas que são, isto é, como instituições voltadas ao lucro que desempenham as suas atividades em regime de concorrência, jornais, revistas, emissoras de rádio e TV, portais de internet etc. pretendem que as suas mercadorias alcancem sempre a maior fatia possível dos consumidores.

É, deste modo, o objetivo de lucro – ou, mais especificamente, os interesses econômicos de alguns poucos detentores de capital da indústria cultural – que decidem quais serão as notícias e, com isso, com que iremos nos preocupar, o que devemos ou não devemos saber, a quais informações devemos nos ater etc. Não se trata, portanto, do que é mais relevante, do que é mais urgente, do que é realmente preciso saber – o que se cogita é “o que venderá mais jornais agora?” ou “o que atrairá mais publicidade no meu site?” ou, em última instância, “o que multiplicará mais intensamente o meu capital?”.

Esta, sem dúvida, não é a melhor maneira de decidir sobre o acesso à informação. O capitalismo, no entanto, deixa muito poucas perspectivas para qualquer outra.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 30/03/2011.]

Nenhum comentário: