terça-feira, 9 de março de 2010

[Crítica Social] Mundo virtual e vida de plástico

MUNDO VIRTUAL E VIDA DE PLÁSTICO

A enorme difusão das redes sociais na internet conduziu à explosão de uma inusitada espécie de narcisismo virtual. Estar à vista de um número indeterminado de pessoas na internet, construir livremente a própria imagem num outro universo, tornar-se um outro virtual – a exposição pessoal pela via digital tornou-se hoje, não raro, uma obsessão para um sem-número de jovens.

Cada um pode, afinal, apresentar-se tal como bem entende em cada uma dessas redes, em verdade apresentar-se como o que gostaria de ser e assim aparecer aos olhos dos outros. Tudo aquilo que o “mundo real”, a implacável realidade, cheia de limitações e percalços, cheia de dificuldades, nega cotidianamente a cada um nós torna-se perfeitamente possível, da maneira mais artificial e ilusória, no “mundo virtual”.

O “mundo virtual” passa a constituir, então, uma válvula de escape, uma via de compensação pelas frustrações impostas pela dura realidade. O jovem mergulhado numa existência cada vez mais destituída de sentido, numa realidade em que as relações pessoais estão cada vez mais degradadas, num contexto em que o consumismo coisifica a vida cada vez mais avassaladoramente, compensa tudo isso por uma auto-imagem entendida como gloriosa, admirável, invejável – embora forjada.

O perfil no Orkut, no Facebook, no Twitter etc. torna-se o meio para realizar a loucura do consumismo da sociedade contemporânea como consumismo de si próprio. Assim como o sabão em pó ou a rede de fast food se apresentam e constroem a própria imagem pela publicidade veiculada na grande mídia, um jovem pode apresentar a publicidade de si mesmo, oferecendo-se ao consumo virtual do outro, pelo perfil exibido vaidosamente na internet. Se o sabão em pó e a rede de fast food planejam o jingle da propaganda e o design de suas logomarcas e embalagens de modo a atrair o consumidor para uma ilusória promessa de realização pelo consumo, as redes sociais virtuais possibilitam o mesmo por fotos, vídeos, comunidades, popularidade “atestada” pelo número enorme de “amigos” ou “seguidores”, tudo milimetricamente planejado para ser exibido. Tudo para demonstrar uma vida própria que, na realidade, não existe – uma vida de plástico.

O princípio do marketing da sociedade de consumo é transposto para o marketing de si próprio. Mas o marketing de si próprio é também a redução de si próprio a mercadoria – no caso, a redução de si próprio a uma mercadoria exposta virtualmente para o consumo alheio. A válvula de escape da vida real é, portanto, ainda pior do que a alternativa: quem tenta “fugir” acaba caindo ainda mais resignadamente na lógica do domínio da mercadoria sobre o homem.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 03/03/2010. DIÁRIO (Dracena-SP), 06/03/2010.]

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