terça-feira, 19 de janeiro de 2010

[Crítica Social] PNDH e realidade brasileira I – reforma agrária

PNDH E REALIDADE BRASILEIRA I – REFORMA AGRÁRIA

Promulgado pelo governo federal no final de dezembro de 2009, o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) tornou-se, em poucos dias, a questão mais polêmica nos noticiários de todo o Brasil. A grande mídia, numa espantosa convergência de opiniões, aderiu quase em uníssono às elites tradicionais e aos segmentos políticos mais conservadores na crítica feroz a pontos-chave do PNDH tais como o avanço nos mecanismos de distribuição de renda, o incentivo à reforma agrária e a promoção do respeito aos direitos humanos pelos meios de comunicação.

Entre os argumentos levantados contra o PNDH são recorrentes aqueles que apelam a um suposto atentado contra o direito de propriedade, contra a liberdade de imprensa ou mesmo os que alegam um estranhíssimo “preconceito” contra o agronegócio. Argumentos, é evidente, que muito vem a calhar para aqueles cujos interesses econômicos e políticos vêem-se ameaçados – mas que interesses são estes e quais as verdadeiras medidas propostas pelo PNDH?

No que diz respeito à reforma agrária, é imprescindível considerar a real situação de distribuição de terras no Brasil. Estipula-se que pouco mais de 1% dos proprietários rurais detenham mais da metade das terras agriculturáveis do país, enquanto os cerca de 99% restantes dividem a outra metade. Segundo dados de 2006 do IBGE, quase 2,5 milhões de propriedades menores do que 10 hectares ocupam 2,7% do total de terras, enquanto menos de 50 mil propriedades maiores do que 1.000 hectares ocupam 43%. Trata-se de uma estrutura fundiária absolutamente desigual, uma das piores do mundo, que traz conseqüências terríveis: desigualdade social, desemprego, problemas na produção de alimentos (já que os latifúndios procuram produzir os gêneros mais lucrativos e não os mais necessários à alimentação dos brasileiros), êxodo rural e favelização nas grandes cidades, violência no meio rural e no meio urbano etc.

Face a isto, o PNDH propõe incentivo à reforma agrária como meio de promover uma melhor distribuição de renda, uma agricultura menos danosa ao meio ambiente, geração de empregos e segurança alimentar. Em verdade, o programa nada procura senão realizar o princípio da função social da propriedade rural, já estabelecido no direito brasileiro desde a Constituição Federal de 1988 (arts. 5º, XXIII e 186), mas quase inefetivo desde então.

O PNDH sequer menciona qualquer medida de expropriação imediata dos proprietários de terras improdutivas ou algo do gênero. É de se perguntar: por que então tanto barulho dos latifundiários e da mídia a respeito? Ora, porque o interesse dos grandes proprietários é exatamente pela da manutenção da distribuição desigual de terras e de todas as suas conseqüências negativas, portanto o exato contrário da realização plena dos direitos humanos para a maioria dos brasileiros. Mas o que deve prevalecer: o interesse econômico de uns poucos ou a dignidade de todos?

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 13/01/2010. DIÁRIO (Dracena-SP), 17/01/2010.]

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