quinta-feira, 16 de agosto de 2012

[Crítica Social] Por que temer as cotas em universidades públicas?


POR QUE TEMER AS COTAS EM UNIVERSIDADES PÚBLICAS?

Há alguns dias foi aprovado no Congresso um projeto de lei que institui a reserva de 50% das vagas nas universidades federais para estudantes provenientes de escolas públicas. Censuras de todos os tipos e baseadas em todos os argumentos possíveis – especialmente nos mais absurdos e preconceituosos – surgiram desde então, mas a medida deve ainda ser encarada como uma vitória.

A universidade pública precisa ser entendida como algo mais do que uma instituição para a pura e simples distribuição de diplomas. Seu papel perante a sociedade na qual se insere e que a sustenta deve ser muito diverso do papel desempenhado por qualquer instituição privada ou por qualquer outro tipo de instituição de ensino. Os seus critérios de seleção devem, exatamente por isso, atender a requisitos muito maiores e mais complexos do que o desempenho num exame vestibular ou a meritocracia.

Nada mais razoável do que ter assegurada, na universidade pública, pelo menos a metade das vagas para estudantes provenientes do ensino público. A metade das vagas é, na verdade, o mínimo: a reserva – ou a “cota”, como se prefere chamar – poderia muito bem ser mais ampla. Trata-se de um meio de garantir o acesso ao ensino superior para a parcela mais abrangente da população e, portanto, de aproximar a universidade pública daquele que deve ser o seu autêntico “público-alvo”. Trata-se, mais ainda, impedir um círculo vicioso pelo qual a parte da população que tem acesso ao ensino superior continua a ser precisamente a pequena minoria mais abastada, como um “privilégio” que continuamente alimenta a si próprio. E, assim, pode-se pretender a participação da universidade pública num importante – ainda que muito superficial, é bem verdade – processo de transformação social.

O sistema de “cotas” não é, claro, o melhor meio para tanto. Um sistema de educação pública universal e de excelência em todos os níveis seria o ideal. Mas este ideal está ainda muito distante: na verdade não pode ser plenamente atingido dentro da estrutura social presente. Assim sendo, exigir o completo imobilismo enquanto um tal sistema de educação pública não se realiza, ou seja, aguardar que este incremento simplesmente “caia do céu” é uma hipocrisia: é uma forma velada de defender que tudo permaneça exatamente como está, que os “beneficiados” continuem a ser os mesmos de sempre, que a educação continue a bloquear ao invés de propiciar alterações na estrutura da sociedade brasileira.

A instituição de um sistema de “cotas” para estudantes provenientes de escolas públicas é apenas o primeiro passo. Por que os opositores das “cotas” se empenham tanto em censurá-las? Por que temem as “cotas”? Ora, os opositores deste pequeno avanço parecem, na verdade, temer a grande massa de despossuídos, explorados e excluídos cujos interesses esta medida indiretamente atende.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 15/08/2012.]

Um comentário:

Anônimo disse...

Um dos problemas do atual sistema de vestibular é que privilegia, de fato, uma pequena parcela da população, de forma que a universidade pública está cada vez mais distante da sociedade como um todo, que não aproveita as manifestações culturais e acadêmicas proporcionados por elas.