quinta-feira, 14 de junho de 2012

[Crítica Social] Sobre o “generoso” salário mínimo


SOBRE O “GENEROSO” SALÁRIO MÍNIMO

Os aumentos do salário mínimo não podem mais ser tão generosos sem elevar o risco de inflação.” Esta foi uma das conclusões da coluna da senadora Kátia Abreu, do PSD, publicada na Folha de São Paulo no último sábado (9/6). Os “aumentos generosos” a que se refere a senadora são, por exemplo, os pouco mais de 14% concedidos no final de 2011, levando o salário mínimo ao valor atual de R$ 622.

Não pretendo aqui desqualificar o texto da senadora apenas por uma frase retirada de seu contexto. Isto não seria, do ponto de vista intelectual, algo de todo adequado – e, mais ainda, é desnecessário, visto que os interesses políticos que aqui se traduzem são por si sós o suficiente para que o leitor mais atento saiba com que tipo de argumento está lidando. Pretendo apenas insistir numa única e muito simples questão: do ponto de vista de quem, afinal, os aumentos do salário mínimo podem ser qualificados como “generosos”?

Certamente o trabalhador assalariado cujos rendimentos não ultrapassam o mínimo não considera, sob nenhum aspecto, o reajuste anual do seu salário como “generoso”. Certamente ele e sua família, constrangidos a “satisfazer” todas as suas necessidades vitais com tão poucos recursos, consideram ainda o salário mínimo e seus reajustes como francamente insuficientes. A tal “generosidade” em questão só pode, então, ser imaginada do ponto de vista dos grupos sociais privilegiados, mais enriquecidos, elites ou, pelo menos, classes médias. Ou seja, do ponto de vista de quem definitivamente não vive do salário mínimo.

De fato, saberia uma senadora da república, da bancada ruralista, o que significa viver com nada mais do que um salário mínimo? Os grandes produtores rurais, as elites tradicionais, a alta burguesia etc. poderiam fazer remota idéia do que significa viver com apenas R$ 622 durante um mês? Tais grupos sociais sabem – e muito bem – qual o “peso” de pagar salários mínimos. Sabem que, via de regra, quanto menores os salários pagos, maiores os lucros. Sabem, portanto, que o aumento do salário mínimo significa, no pólo oposto ao dos trabalhadores, maiores “despesas”.

O ponto de vista de quem acusa o aumento do salário mínimo de “generoso” só pode ser, no fim das contas, o de quem não vive com tão pouco e, mais ainda, o de quem vê o salário mínimo como “obstáculo” para o “elevado” objetivo de lucrar sempre mais. Trata-se, portanto, de um ponto de vista que não apenas não corresponde ao do trabalhador – isto é, ao ponto de vista da imensa maioria da população –, mas, na verdade, constitui o seu adversário direto, o seu maior opositor. Trata-se precisamente do interesse pela manutenção da desigualdade econômica que alimenta o enriquecimento de uma minoria, pela manutenção ou agravamento da exploração do trabalho que move a multiplicação do capital, pela perpetuação ao infinito das mesmas estruturas sociais pelas quais se organiza a sociedade presente.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 13/06/2012.]

Um comentário:

blog alternativo disse...

Celso, tudo bem?
Parabéns pelo blog, e pelas lições profundas que encontram-se nesses publicações.
Quero saber quando será possível ler a sua tese de doutoramento. Estive presente na sua dissertação, e estou pesquisando Pachukanis para o trabalho de conclusão de curso.
abraços