sábado, 14 de maio de 2011

[Crítica Social] União estável, família e discriminação

UNIÃO ESTÁVEL, FAMÍLIA E DISCRIMINAÇÃO

O Supremo Tribunal Federal tomou, na última sexta-feira, uma importante posição no que diz respeito ao reconhecimento dos direitos dos homossexuais. Na prática, a união estável entre pessoas do mesmo sexo, o que se tem chamado de união homoafetiva, foi equiparada à unidade familiar.
 
Trata-se, sem dúvida, de um avanço. Mas de um avanço apenas relativo, não mais do que isto – quero dizer: não ainda, nem de longe, uma solução. As ações julgadas pelo STF não tinham mesmo qualquer outra possível solução razoável – por que, afinal, do ponto de vista jurídico, a união entre pessoas de sexo diferente constituiria uma família e a união entre pessoas do mesmo sexo não? –, mas as decisões do STF não são sempre exemplares pela sua razoabilidade: a decisão acerca do aborto de fetos anencéfalos é a prova cabal disto. Assim, se, para todos que pretendem ver erradicada esta modalidade hedionda de discriminação, há algo que comemorar, é porque o contexto é tão desfavorável que mesmo o óbvio parece já uma vitória.
 
O avanço, porém, não é mais significativo porque a discriminação juridicamente perpetuada que atinge os homossexuais foi apenas amenizada. Um casal homossexual pode realizar uma união estável e, a partir de agora, é provável que terá mais facilmente reconhecidos, por exemplo, os direitos de adotar e de herdar. Isto, sem dúvida, é melhor do que nada. No entanto, o casamento propriamente dito continua juridicamente reservado a casais heterossexuais.
 
Em outras palavras, um casal heterossexual pode decidir entre o casamento e a união estável, mas um casal homossexual não pode. A Constituição e o Código Civil continuam a referir-se ao casamento como “união entre homem e mulher” e, portanto, o dispositivo da própria Constituição que determina a igualdade de todos perante o direito continua limitado de maneira incompreensível e questionável. A “racionalidade” que os juristas tanto estimam e que supõem caracterizar o direito continua em xeque. E esta “irracionalidade” jurídica perpetuada, por sua vez, contribui para perpetuar, ao menos do ponto de vista simbólico, a irracionalidade da discriminação contra os homossexuais.
 
A única solução jurídica aceitável para esta questão – que, por sua vez, não é e nem pode ser a solução definitiva da discriminação – exige alterações legislativas profundas. A decisão do STF é apenas um dos primeiros ensaios, um passo não mais do que cambaleante – o melhor que se pode esperar é que, a partir daqui, providências cada vez mais efetivas sejam tomadas.


[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 10/05/2011. REVISTA TEM (Dracena-SP), junho/2011]

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