domingo, 18 de julho de 2010

[Crítica Social] Milagre da multiplicação?

MILAGRE DA MULTIPLICAÇÃO?

A Copa do Mundo de 2010 terminou. A Copa do Mundo de 2014, no entanto, está apenas começando. Ao longo dos próximos 4 anos, para que o Brasil esteja “à altura” de sediar este que é considerado um dos mais importantes eventos esportivos do mundo, serão milhões e milhões de reais investidos em infra-estrutura de transportes, hotéis, estádios etc. Em outras palavras, cifras milionárias investidas em “maquiagem” urbana e arenas esportivas cuja utilização primordial será dada por turistas de classe média alta – ou seja, não pela população local de baixa renda – durante um mês no ano de 2014.

As notícias dão conta que, na Copa da África do Sul, o gasto apenas com a construção e reforma dos estádios foi de cerca de 3,5 bilhões de dólares. E não faltam, mesmo entre os sul-africanos, movimentos que questionam a verdadeira utilidade social disto. No Brasil não será diferente: o orçamento oficial dos preparativos para 2014 é, até o momento, de 17 bilhões de reais (mas vale lembrar que o custo final da Copa de 2010 foi 10 vezes superior ao orçamento inicial).

A grande questão aqui talvez seja: de onde pode surgir tanto dinheiro? E a questão ganha relevância sobretudo quando se trata de um país que, embora “em desenvolvimento”, é ainda contado entre as áreas mais pobres do mundo, com altos índices de exclusão social, com uma série de gravíssimos problemas sociais absolutamente por resolver e permanentemente carente de recursos para investimentos sociais. Afinal, se é possível reunir tanto dinheiro, por que investi-lo em uma competição esportiva e não, por exemplo, no enfrentamento à miséria?
É bem verdade que os gastos públicos com a Copa do Mundo terão algum retorno, por exemplo com a geração (pelo menos temporária) de empregos, com a publicidade turística do Brasil no exterior, com obras que poderão ser úteis mesmo depois do período dos jogos. Se, no entanto, os benefícios para a população brasileira fossem a prioridade, não seria necessário esperar o retorno: o investimento direto dos bilhões de reais em algumas questões cruciais seria, com absoluta certeza, muito mais eficiente.

Porém, é certo que, para o enfrentamento à desigualdade social, tantos bilhões não surgiriam tão facilmente. Que ninguém se engane, o investimento para a Copa não é um investimento para a população, não é um investimento pela “beleza do esporte”, mas sim um investimento para os capitais que, com o evento, terão seus lucros multiplicados. É mais ou menos o mesmo que ocorre nos momentos de crise econômica, quando do dia para a noite somas astronômicas surgem para o socorro público aos bancos privados. O dinheiro “milagrosamente” se multiplica, mas apenas para o que interessa. E nenhum capital está interessado em redistribuição de renda, em direcionamento de recursos para a camada menos privilegiada da população – aqui ou na África do Sul ou em qualquer outro lugar...

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 14/07/2010.]

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