quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

[Crítica Social] Sobre o comunismo de Niemeyer


SOBRE O COMUNISMO DE NIEMEYER

O comunismo de Oscar Niemeyer nunca foi o melhor comunismo. Dizer-se comunista ao longo de toda a vida, diante dos meios de comunicação, inclusive em períodos políticos de repressão, é, sem dúvida, um ato de coragem. Mas é impossível não reconhecer que, muito distante do necessário radicalismo, marcado por desvios idealistas e compromissos com a sociedade presente, o comunismo de Niemeyer não foi mais do que uma posição política muito diluída.

Por isso, o grande legado de Niemeyer, presumo, é mesmo a sua arquitetura – embora não esteja ao meu alcance opinar especificamente a respeito –, não os seus ideais políticos. Isto, aliás, a grande mídia, no esforço de glorificar o “gênio” Niemeyer (a morte parece ter esta consequência necessária entre as personalidades), tem procurado destacar. Da pior maneira, é claro.

Há, para os meios de comunicação, duas opções. A primeira delas é destacar a “genialidade” da arquitetura de Niemeyer e, ao mesmo tempo, desprezar o seu comunismo ou tratá-lo como uma espécie de “anedota”. Esta foi, por exemplo, a escolha da Rede Globo: em meio a toda a adulação da cobertura de seus telejornais, até mostraram, num ato de “tolerância” para com as idiossincrasias de um velho, o caixão coberto pela bandeira vermelha com a foice e o martelo.

A outra opção é a que faz questão de antepor uma ressalva explícita: “apesar do comunismo”. A morte, no fim das contas, amplifica todas as virtudes e apaga quase todos os “vícios”, mas um “vício” tão grave (do ponto de vista característico da mais odiosa posição de classe burguesa) como ser comunista não pode ser deixado de lado tão facilmente.

Exemplo contundente desta postura pode ser encontrado num texto publicado na Folha de São Paulo na última sexta-feira (“Ideologia de Niemeyer foi mero detalhe”, Bárbara Gancia, p. C-2). Nele, a colunista lamenta que Niemeyer não tenha “constatado” que “a alma humana, por questões meramente evolutivas, é movida a competitividade e a busca do individualismo”. E conclui o seu argumento anticomunista com a apoteótica tese: “o que conta agora são a vigilância constante pela regulamentação do sistema econômico e a viabilização legal da sustentabilidade”.

Impressiona a capacidade de condensar tantos equívocos em tão poucas palavras. Por trás desses argumentos há: (1) a defesa de um tosco evolucionismo que naturaliza, talvez no desespero de justificar o injustificável, condições típicas de um tempo histórico muito determinado; (2) o ingênuo ou cínico entendimento de que a dinâmica do capital pode ser “domada”; (3) a precaríssima proposta de que isso possa ser feito por meio da boa vontade; (4) a pouco plausível defesa das formas jurídicas e políticas como meios de controle externo e neutro da estrutura econômica.

O comunismo de Niemeyer, mesmo não sendo o melhor, está seguramente muito acima deste tipo de crítica. Mesmo moderada e ingênua, a sua posição política é ainda muito mais precisa, mais rigorosa e mais solidamente fundamentada. Afinal, entre o comunismo moderado ou a absoluta falta de razão, não é nada difícil ficar com a primeira alternativa.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 12/12/2012.]

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