quinta-feira, 26 de julho de 2012

[Crítica Social] Pinheirinho, seis meses depois


PINHEIRINHO, SEIS MESES DEPOIS

Pouco mais de seis meses atrás, o Pinheirinho, em São José dos Campos, foi invadido por policiais armados e os seus milhares de moradores foram retirados de suas casas à força. Um espetáculo de violência gratuita, de arbitrariedade e de ausência do mínimo bom senso. Uma demonstração não menos do que cabal de uma “política social” baseada na imposição, na pancadaria, na criminalização da pobreza. Um evento deplorável, noticiado ao seu tempo com o sensacionalismo de hábito, mas que a grande mídia, no seu compromisso infalível com as elites brasileiras, deseja ansiosamente esquecer para sempre.

Seis meses depois, o terreno foi reintegrado, os moradores foram expulsos. Há certamente uma meia dúzia de seres humanos profundamente satisfeitos por conta disso – e o que será do terreno daqui por diante pouco importa, exceto para esta meia dúzia. No outro extremo, há milhares de famílias com as quais ninguém parece se importar. Milhares de famílias que já viviam em situação precária e que perderam as suas casas. Que tipo de vida estas milhares de pessoas levam hoje, onde moram, como sofreram ou ainda sofrem com a expulsão do Pinheirinho, ninguém sabe – só o que se sabe é que, do ponto de vista do poder público, tudo isto é secundário frente à satisfação daquela meia dúzia de “proprietários”.

É por estas pessoas, por esta ferida eternamente aberta, que o Pinheirinho não pode ser esquecido. O transcurso do tempo não pode legitimar o absurdo, o silêncio não pode tornar aceitável o inaceitável. Pois em janeiro de 2012 o interesse especulativo de uns poucos prevaleceu implacavelmente sobre as necessidades vitais de milhares, a força foi utilizada para proteger o formalismo da propriedade privada ao custo de extirpar milhares da única moradia de que dispunham, a violência aberta foi o “instrumento” descaradamente escolhido para “solucionar” uma questão social grave e complexa.

Este recurso à violência como mecanismo de “solução” de questões sociais tornou-se, na verdade, um hábito – ao menos no estado de São Paulo. Pudemos assistir a isto, apenas para ficar com casos recentes e de grande repercussão, também na “cracolândia” e na USP. Para além do confortável microcosmo do noticiário da TV e dos grandes jornais, revistas e sites da internet, este hábito já existe há muito tempo e atinge sobretudo as periferias das grandes cidades. O Pinheirinho é apenas um “marco”, um caso a destacar em meio uma imensidão anônima e cotidiana de violência institucional contra a pobreza – e exatamente como “marco” é que ele deve ser lembrado.

Contra o absurdo que se perpetua dia após dia, contra o absurdo de uma estrutura social que se alimenta da pobreza de muitos, contra esta estrutura social que oprime as classes exploradas, a capacidade de indignar-se é um pequeno e ineficaz remédio. Mas este pequeno e ineficaz remédio é ainda o mínimo que podemos esperar.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 25/07/2012.]

Nenhum comentário: