quinta-feira, 15 de março de 2012

[Crítica Social] Mortes e ressurreições da esquerda


MORTES E RESSURREIÇÕES DA ESQUERDA

Há, ao que parece, uma enorme ânsia por declarar a morte da esquerda. As datas do suposto “sepultamento”, sempre renovadas, são muitas. O século XIX, o século XX, o século XXI. As “prováveis” causas da morte são inúmeras: os direitos do trabalhador, o Estado de bem-estar social, o neoliberalismo, a integração da classe trabalhadora pelo consumo, a terceirização e a precarização do trabalho, o desenvolvimento das forças produtivas, o “encolhimento” da indústria em face da “expansão” da economia de serviços etc.

Mas a mesma esquerda incansavelmente declarada morta e sepultada, repetidamente vítima de uma propaganda suspeita que atesta ostensivamente a sua extinção, “renasce” uma vez após a outra, sem cessar. A mesma esquerda que, por tantas razões “deveria” prestar o “favor” de desaparecer, volta do inferno para denunciar a insensatez deste mundo, para dizer o indizível, para expor as raízes mais obscuras da sociedade presente. Volta com toda a força para deixar claro que ainda há contra o que lutar, que ainda há disposição para a luta, que ainda há luta.

A esquerda, na verdade, não morre. Ao menos a perspectiva mais radical da esquerda, porta-voz da crítica mais profunda da sociedade capitalista: esquerda, afinal, não simplesmente o mesmo que “ser do contra”. E esta esquerda mais radical não morre porque está fundamentalmente atrelada a certas condições sociais muito concretas, condições sociais que, uma vez mantidas, mantêm vivas também a sua mais profunda oposição: trata-se de uma perspectiva de classe numa sociedade marcada por uma profunda oposição entre classes sociais.

Ora, por mais que a sociedade capitalista tenha se transformado ao longo do tempo, por mais que tais transformações tenham sido profundas, o seu núcleo mais elementar é, na essência, o mesmo. A submissão do trabalho ao capital, o processo de expropriação da mais-valia, a exploração da classe trabalhadora por uma minoria de detentores do capital permanecem. E assim permanece, ainda que mais ou menos ativa de acordo com as circunstâncias, a perspectiva política correspondente à classe trabalhadora explorada.

Esta perspectiva política encontra a cada momento as suas grandes trincheiras, põe suas forças naquilo que está ao alcance, mas não se cala. Esta perspectiva política permanece sempre viva na medida em que mantém como horizonte final – embora nem sempre claro – a transformação social radical, a superação definitiva da sociedade capitalista, a sua completa ultrapassagem por uma forma social radicalmente outra, diversa, nova.

Enquanto não for vencida esta etapa, nenhum discurso, nenhuma sepultura fictícia, nenhuma causa mortis será suficiente.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 14/03/2012.]

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