quinta-feira, 29 de março de 2012

[Crítica Social] Capitalismo e desigualdade

CAPITALISMO E DESIGUALDADE

“Quando a sociedade civil-burguesa encontra-se na eficácia desimpedida, assim ela é concebida em seu próprio interior como povoação e indústria progressivas. – Pela universalização da conexão dos homens mediante seus carecimentos e os modos de preparar e distribuir os meios de satisfazê-los aumenta-se a acumulação de riquezas, de uma parte, – pois dessa dupla universalidade resulta o maior ganho –, enquanto que, de outra parte, aumentam também o isolamento e a delimitação do trabalho particular e, com isso, a dependência e a miséria da classe ligada a esse trabalho, ao que se ligam a incapacidade de experimentar o sentimento e a fruição de outras capacidades e, particularmente, as vantagens espirituais da sociedade civil-burguesa.”
– G. W. F. Hegel, Filosofia do direito, § 243

No trecho em questão, da obra de 1821, Hegel demonstra notável conhecimento de uma característica fundamental da sociedade capitalista: a expansão da riqueza, por um lado, está essencialmente vinculada à expansão da miséria, no outro. A ampliação dos meios de satisfação de necessidades não repercute na igual repartição desta satisfação: ao contrário, amplia as necessidades e o número de necessitados. Geração e repartição de riquezas se opõem.

Hegel concebe, portanto, a sociedade capitalista nos quadros de uma dialética entre opulência e miséria, ambas simultaneamente em oposição e em expansão. Mas, limitado a uma compreensão desta opulência e desta miséria em termos de distribuição, Hegel não é capaz de revelar as suas determinações mais profundas.

A sociedade capitalista não apenas distribui desigualmente. A sua desigualdade essencial, a desigualdade sobre a qual esta sociedade se estrutura, é uma desigualdade sediada na esfera da produção. Uma minoria concentra em suas mãos os meios de produção, enquanto a imensa maioria é completamente expropriada, nada possui, exceto a sua própria força de trabalho. Esta maioria despossuída é economicamente constrangida a vender a sua única posse – as suas próprias energias vitais, em última instância – e assim vê o seu trabalho explorado, submetido ao capital, ao movimento de multiplicação do capital.

Noutros termos, a sociedade capitalista se estrutura sobre uma desigualdade (irreconciliável) de classe. Trata-se de uma estrutura econômica que produz através da desigualdade – uma desigualdade, é verdade, mediada pela forma jurídica da igualdade entre os indivíduos, mas que, de todo modo, não apenas distribui desigualmente. Esta desigualdade, no entanto, escapa a Hegel: o seu desvelamento teve que esperar até Marx.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 28/03/2012.]

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