quinta-feira, 4 de agosto de 2011

[Crítica Social] Luz e trevas

LUZ E TREVAS

Enquanto o mundo todo parece preocupado com problemas como a reciclagem e a sustentabilidade, a proibição do fumo em lugares abertos ou fechados, o bullying ou qualquer outra grande sensação instantânea e “urgentíssima”, as questões políticas mais básicas e potencialmente perigosas continuam intocadas. A discriminação de classe, o ódio racial, a intolerância religiosa e tudo mais que insufla as tendências mais violentas de extrema direita, tudo aquilo que já alimentou experiências totalitárias no século passado, continua a se mover nas sombras das “maravilhosas” democracias do ocidente e do discurso “politicamente correto” oficial e inescapável.

O que ocorreu na Noruega dias atrás é uma evidente demonstração disto. É claro que, neste caso, certos fatores psicológicos e individuais não podem ser negligenciados, mas a sobrevivência dos ideais reacionários mais extremados, dispostos aos mais insensatos atos de violência aberta, há de ser tomada com preocupação.

Não é por acaso, com toda a certeza, que o tal “documento” de mais de 1000 páginas disseminado pelo atirador recebeu declarações de apoio de vários grupos europeus de ultradireita. Nem é por acaso que esses mesmos grupos têm, nos últimos anos, conquistado cada vez mais terreno nas disputas eleitorais daquele continente.

Notável, no mais, que, além de uma intolerância extremada contra o islamismo, os ataques tenham sido motivados por oposição a uma esquerda não mais do que moderada. A despeito do apelo declarado como “antimarxista”, foi como resistência ao predomínio de um partido social-democrata que os ataques ocorreram. Foi, portanto, também um ato de intolerância política extremada.

Uma tal intolerância se volta contra conquistas sociais mínimas, quero dizer, um mínimo de “bem-estar social” proporcionado por uma atuação estatal ainda superficial. Volta-se contra a previdência social, a saúde pública, a garantia de salários minimamente adequados, enfim, contra os direitos sociais que mesmo a esquerda um pouco mais firme considera sumamente insuficientes. Contra o placebo, o paliativo que sequer atinge o núcleo da sociedade capitalista – pois mesmo isto é, do ponto de vista desta ultradireita, uma ameaça.

Se mesmo com um “progresso” social mínimo, quero dizer, com um mínimo de redução de desigualdades sociais e prestação de serviços públicos pelo Estado, esta ultradireita não está disposta a concordar, o que esperar dela? Se mesmo este mínimo serve de pretexto para tamanha violência, que resistência se deve esperar para qualquer tentativa mais radical de transformação social? O episódio da Noruega obriga com horror a lembrar aquilo que, afinal, não deve nunca ser esquecido: as forças conservadoras mais odiosas e sanguinárias continuam acordas nas trevas e continuam dispostas a tudo para impedir qualquer avanço desta sociedade em que vivemos.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 03/08/2011.]

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