quinta-feira, 9 de junho de 2011

[Crítica Social] O que é “interesse público” em São Paulo?

O QUE É “INTERESSE PÚBLICO” EM SÃO PAULO?

Tem sido objeto de debate, nas últimas semanas, a construção do estádio de São Paulo que deverá abrigar os jogos da Copa de 2014. A esse respeito, o governo estadual tem declarado reiteradamente que não investirá recursos públicos diretamente porque uma competição esportiva não é de interesse público. Ao mesmo tempo, o mesmo governo estadual, diante da queixa de um grupo relativamente pequeno de moradores do bairro de Higienópolis, titubeia ante a construção de uma estação de metrô naquele local. Neste caso, porém, não pode justificar por que o interesse público na ampliação do metrô deve ceder ao interesse privado de alguns poucos.
 
Parece mesmo bem pouco questionável que o campeonato esportivo não atende ao interesse público, ao menos não da mesma maneira como escolas, hospitais, transporte coletivo etc. Se o poder público alega, para o que realmente interessa, a ausência de recursos e a “reserva do possível” como justificativa para a inércia, é inaceitável que os recursos miraculosamente apareçam para a construção de estádios de futebol. Ao mesmo tempo, parece ainda menos questionável que o metrô atende ao interesse dos mais de 10 milhões de habitantes da cidade de São Paulo e, portanto, seja “mais público” do que o interesse dos cerca de 3 mil moradores que se mostraram preocupados com o “público diferenciado” que passaria a ocupar Higienópolis. Isto, em especial, se considerarmos que a cidade de São Paulo se aproxima de um colapso no seu trânsito e continua a ter um sistema de metrô com menos de um terço da extensão de outras cidades com população similar mundo afora (Nova Iorque, Tóquio, Moscou etc.).
 
Ora, o que é “interesse público” para o governo paulista? Ao que parece, o entendimento é variável conforme a ocasião. Se se trata de construir estádio para o evento esportivo que servirá de publicidade para o governo federal do PT, o governo estadual do PSDB considera estar diante de mero interesse privado. Se se trata, por outro lado, de atender à queixa de parte da elite paulistana, representada por moradores de um dos bairros mais “nobres” da cidade, então o mesmo governo considera estar diante do interesse público. Coincidência? Ou “interesse público”, para o governo paulista, é exatamente aquilo que coincide com os interesses dos próprios membros deste governo?
 
Na verdade, a própria idéia de “interesse público” é, para qualquer governo e em qualquer instância, uma distorção. Por trás dela reside uma visão da sociedade como conjunto homogêneo, não cindido em classes, cujo representante também homogêneo é o Estado. Nada mais equivocado. O interesse na manutenção da sociedade presente e de suas formas políticas é exclusivamente da classe dominante, francamente minoritária: o interesse da maioria não encontra atendimento efetivo na ação do Estado e, de um modo geral, no interior da sociedade capitalista. No interior desta sociedade, a idéia de “interesse público”, não por acaso abusivamente vaga, só pode mesmo servir a todo tipo de manipulação e de retórica que, no fim das contas, trata sempre de vilipendiar ainda mais os interesses da maioria dominada.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 08/06/2011.]

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