quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

[Crítica Social] Heavy metal e crítica social

Para Júlio Criscimani

HEAVY METAL E CRÍTICA SOCIAL


Há, talvez, mais a se dizer sobre o que o heavy metal não é do que propriamente sobre o que é. Ou, no mínimo, isto parece mais fácil – mesmo para um adepto. O heavy metal não é exatamente um gênero musical homogêneo. Não é, igualmente, um gênero universalmente apreciado ou – o que é o mesmo – amplamente difundido pela grande mídia. Em especial, não é um gênero a ser contado entre os mais politizados – certamente está muito atrás, nesse aspecto, de gêneros como, por exemplo, o punk.

No entanto, a despeito da sua própria recusa a respeito, o heavy metal tem um aspecto político não de todo insignificante. E não se trata de uma politicidade de direita, conservadora ou mesmo reacionária, como usualmente – e, não raro, de forma deturpa – se supõe.

É bem verdade que um certo apelo do heavy metal ao passado é comum. É, de fato, tema constante de suas músicas a glorificação de uma visão – romantizada e, portanto, irreal – da Idade Média, de uma idealização da vida guerreira ou cavaleiresca, da mitologia nórdica (ou de quaisquer outros mitos pré ou anticristãos) etc. Comum, no mesmo sentido, uma certa aproximação ou tentativa de aproximação em relação à música clássica.

Isto, porém, não implica uma imediata assimilação do heavy metal a um apelo político pelo regresso, um anacrônico conclamo à restauração. O apelo ao passado não significa – pelo menos não necessariamente – um saudosismo do estamento, uma defesa do privilégio ou, de uma maneira mais geral, uma apologia a algum tipo de segregação social. Trata-se, acima de tudo, de uma manifestação de contrariedade à sociedade presente, de uma oposição à ordem estabelecida.

É verdade que, no limite, o heavy metal não está isento de ligações até mesmo com visões políticas fascistas. À exceção de um infeliz extremo, contudo, o heavy metal em geral dá vazão, de um modo no mais das vezes politicamente inconsciente por parte de seus adeptos, a um profundo incômodo em relação ao mundo dado aqui e agora. A nostalgia de um passado não vivido funciona aqui como alternativa – ainda que de modo meramente ideal e, portanto, conscientemente ineficaz – àquilo que está dado e que, diante do desconforto dos desajustados, parece imutável.

Em outras palavras, o heavy metal opera por um mecanismo próximo ao escapismo, como uma espécie de fuga imaginária que canaliza uma massa de contrariedade impotente e, por isso mesmo, cada vez mais reduzida à impotência. Não há de ser, portanto, um gênero revolucionário. Como tudo mais no mundo capitalista, o heavy metal não escapa da dinâmica da mercadoria – e o seu caráter de contrariedade é exatamente o que garante o seu mercado. Por outro lado – e eis o seu aspecto político importante –, a sua simples existência (ou melhor, a existência dos seus adeptos) indica que este mundo não está tão seguro quanto parece.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 12/01/2011.]

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